Era uma vez um
casal que planejou ter uma criança, e esse seria o primeiro sobrinho, o
primeiro neto, o primeiro orgulho da família, mas acontecimentos mudariam a
rota dessa história. Seria esse o começo de uma história de ficção, mas disso
só tem o “era uma vez”.
Nasci nessa
família com grande ligação religiosa, fui criado para ter fé, para considerar a
Deus e ao próximo, porém até certo ponto sozinho, já que era filho único.
Convivi bastante com adultos, meu pai trabalhava muito e minha mãe me levava
para todos os lugares, mas lembro que um fato em si mudou drasticamente a
maneira que eu encararia a vida. Aos 4 para 5 anos de idade mais ou menos, fui
convidado por um familiar, não muito mais velho que eu, para uma “brincadeira”
num lugar, só soube do que se tratava quando cheguei a esse lugar. Fui violado
digamos assim, sem requintes de violência, aquela “brincadeira” pareceu ser
algo interessante de se acontecer, era algo novo. Ele me pediu segredo sobre o
assunto, mas sem ameaças. Aquela “brincadeira” se repetiu inúmeras vezes, até
que outras crianças também eram iniciadas naquilo ali. Depois daquele dia,
nunca mais vi os meninos da mesma forma, chegando até mesmo em alguns momentos
rejeitar ter nascido homem, pois se eu fosse menina, poderia ter aquele
sentimento naturalmente. Parece definitivo falar que uma criança de 5 anos
pensasse dessa forma, mas era o que eu tenho memória plena de como era o meu
pensamento naquela época.
Um dia, minha
mãe e tia, me chamaram para conversar, pois havia um surto de crianças abusadas
naquela época, e temerosas, resolveram me alertar para que não deixasse que
alguém fizesse algo que era feio, descabido e fora de propósito. Enquanto
falavam, vi que a tal “brincadeira” era algo errado, e me calei, não disse nada
a ambas sobre o fato de já estar passando por aquela situação, afinal era
errado e também o meu segredo particular.
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Os anos foram
passando, e essas experiências sexuais duraram até os 10 para 11 anos quando as
mudanças do meu corpo aconteceram, e o sentimento de que aquilo deveria parar
aumentando e que Deus poderia me castigar por aquilo tudo como havia aprendido.
Porém, as fantasias com outros garotos e romantizações sempre permaneciam.
Apaixonei-me por uma menina na escola que estudava, era um namorico de
adolescentes, que não deu muito certo. Logo me vi apaixonado por um garoto da
minha sala, foi um martírio, dias de choro, de sofrimento, isso durou mais de
dois anos. Depois houve outro garoto e mais outro.
Nesse pano de
fundo, meus pais falavam em divórcio, tudo aquilo era aterrorizador para mim,
então com a fé que tinha aprendido e até ensinava outras crianças num curso
daquela linha de fé, fazia orações para que eles não se divorciassem, pois eu
seria a única criança sem os pais juntos já que todo mundo tinha os tinham do
meu círculo de amizades. Não adiantou nada, eles se divorciaram e nossas
dificuldades financeiras começaram, pois meu pai tinha outra família. Eu, minha
mãe e meu irmão mais novo agora estávamos sós. Uma tristeza imensa tomou conta
de mim e desejava morrer todos os dias. Todo dia acordar era um sofrimento
anunciado, me xingava em frente ao espelho, odiava tudo em mim, a morte
realmente seria a solução para as minhas angústias. Até que conheci realmente
aquele que eu tinha ouvido falar, mas era uma figura tão apagada pra mim,
Jesus. Ganhei uma nova vida, a vontade de morrer desapareceu, a atração pelo
mesmo sexo ficou ali soterrada, nem lembrava que existia isso. Tinha agora uma
turma na igreja, mais ou menos a minha idade, agora sim tinha chegado ao meu
lugar, em contato direto com o Criador do Universo. As guerras interiores, as
angústias, estavam enfim sendo submetidas ao espelho de Deus, me enxerguei
realmente na imagem que ele me mostrou.
Mas, tudo que
não é encarado, não desaparece, uma hora vem á tona e com mais intensidade
ainda. Comecei a ser rondado e sondado pela serpente igual à Eva, tinha
certezas como ela, mas a proposta da serpente pareceu bem interessante, e as
certezas de Deus em mim, não eram tão certas assim. Reencontrei uma pessoa que
fez parte da minha infância na igreja, fiquei sabendo de coisas que pareciam
surreais. Lugares, relacionamento entre pessoas do mesmo sexo que eram
totalmente fora das minhas até então fantasias, fora de tudo que eu conhecia.
Um mundo realmente novo, o mundo GLS.
Não demorou
muito para que eu fizesse uma escolha, me dar uma chance para um relacionamento
com outro homem. Já que tinha orado, jejuado, feito campanhas e eu achava que
tudo aquilo já tinha finalizado, vi que realmente era algo que poderia viver,
não tinha escolhido aquele
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sentimento, mas o que eu queria naquele momento era
colocá-lo para fora. Começou a peregrinação das buscas de um relacionamento
estável, tranqüilo e fiel. Afinal eu tinha preceitos cristãos e não queria sexo
por sexo, apesar de poucas vezes ter me submetido a isso. Eu queria algo mais,
e por que não?
A balada não era
o ponto principal, era só um lugar para ver pessoas que de semelhantes só o
mesmo sentimento, fora isso via uma euforia no ar travestida de alegria.
Alegria mesmo era ali com Deus, na igreja, que vinha do interior, aquilo tudo
ali era euforia, mas estar ali era até interessante. O mundo virtual era um
lugar até certo ponto seguro para conhecer pessoas, mais do que em baladas.
Horas e horas de buscas, de conversas, de seleções, de namoros virtuais, de
encontros reais. Algumas surpresas, outras decepções. O namoro não passava de
tentativas, logo as reais intenções das pessoas apareciam.
Passado um
tempo, em meio a essa busca do príncipe encantado, recebi uma boa proposta de
emprego, pois Deus permanecia o mesmo apesar de eu não. Então parei com toda
aquela prática, para digamos honrar o que Deus estava me dando. Fiquei dois
anos sem ir às baladas, sem me envolver com alguém, mas tudo de novo somente
soterrado, nada encarado. Minha vida espiritual parecia ir muito bem, sempre
gostei de ler a palavra de Deus (Bíblia), passar horas lendo e meditando. Ia
aos cultos, parecia tudo muito bem mesmo. Até que um dia, me senti carente, e
voltei a entrar nos chats com a desculpa, que já tinha passado tanto tempo, e o
ciclo de pessoas passaram por ali, será que não tem alguém de verdade para mim?
A resposta não
demorou muito. Conheci um rapaz que era de outro estado então seria inviável
algum relacionamento, apesar de acreditar que existia algum tipo de namoro
virtual (aliás, acreditei várias vezes nisso). Mas um dia, chegou um rapaz. Eu
não estava tão disposto assim, já que já vinha machucado demais para tentar.
Não acreditava mais no que diziam, e tinha levantado barricadas para me
proteger de um novo relacionamento. Mas ele disse a coisa certa na hora certa.
Encontramo-nos, parecia tudo perfeito, até a página dois. Uma traição atingiu
ali e tudo que era uma certeza naquele relacionamento caiu. Naufragou mais uma
vez o pseudo envolvimento que tinha. Sentei com o Senhor e perguntei o que
estava errado. Não sabia gostar diferente, sentir diferente, mas e o que eu
sabia sobre a palavra de Deus no quesito homossexualidade era bem claro. Deus
me mostrou por que aqueles relacionamentos não davam certo, era que o lugar que
eu queria colocar alguém, já tinha alguém ali há alguns anos. Era
o lugar de Jesus Cristo.
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